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sábado, 11 de julho de 2015

O bife no bolso do terno




Em minha infância sofria de um mal constrangedor: era gago e pronunciava o “P” no lugar do “b”, e palavras como “Pampulha”, eu pronunciava “Bambulha”, branco era pra mim “Blanco” e assim por diante.
Quando ficava nervoso, sentia falta de ar e cheguei até perder os sentidos.
Pois muito bem, fui me tratar com um medico homeopata que proibiu, terminantemente, que eu ingerisse carne de qualquer espécie e me explicando que nosso estômago não é cemitério e que a carne provém da dor e do sofrimento, por isso, certamente, esses sintomas eram o sentimento dos animais mortos que havia ingerido que estava me causando tanto mal.
  Acreditei piamente no que o doutor me disse e me transformei num vegetariano convicto. Ficava feliz em ver no meu prato uma bela salada de alface, tomate, agrião e aipo.

Transformei-me em atleta e minha alimentação básica era feita, principalmente, de soja e verduras verde e vermelha, além de milho.
Deu resultado. Fiquei mais calmo, aumentou o meu autocontrole em relação ao ambiente em que vivia.
Mas, apareceu em minha vida uma linda garota, Seu nome Geni, idade 17 anos (a mesma que eu) filha de um sitiante da região.
Era engraçado quando saiamos  juntos, eu, um baita crioulo, ela uma peça de porcelana, branquinha e frágil. O amor começou a florescer em nossos corações juvenis e como queria mostrar que tinha as melhores intenções para com ela, fui me apresentar ao seu genitor e esse ato muito lhe alegrou.
Fiquei amigo do Sr Ferreira (o pai de minha namoradinha), me tratava como a um filho, mas tinha a constrangedora mania de me agradar ao extremo e toda noite, era obrigado a ouvir o desafinado som da sanfona acompanhado das musica Chico Mineiro, Tristeza do jeca, Meu primeiro Amor e outras musicas; quando bem interpretada é o fino do cancioneiro popular nacional.
            Além de ouvir suas belas (?) interpretações, vinha o pior. Mandioca frita (até aí tudo bem) com torresminho de porco (aí!)
           Não sabia dizer não e tinha que comer o que era servido.
          Num belo sábado, não resisti. O meu compenetrado sogro me disse que tinha uma surpresa para mim e que deveria vir a rigor. Pois sim, vesti o meu terninho de linho azul-marinho,acompanhado de uma camisa linda de cor rosa, sapato preto bem engraxadinho e fui para a casa da minha namoradinha.
Chegando lá, foi anunciado o noivado de uma das cunhadas do seu Ferreira. Depois da solenidade de aceite dos responsáveis pela mão da moça, os olhos se voltaram para mim, como a me perguntar: e você, quando pedirá?
Dei uma de desentendido e fui tomar uma fresca do lado de fora da casa
Minutos depois me chamaram para jantar, seria um jantar especial: Bife de fígado com cebola, arroz branco, feijão com miúdo de porco acompanhado por salada de palmito e cebola.
Olhei desesperado para minha namorada e ela não entendeu, Menti dizendo que estava com problemas estomacais, mas isso foi um erro, pois acharam que eu estava desfazendo da hospitalidade da família.
Esqueci um detalhe que foi coadjuvante no drama desta cena. Como o sitio era no distrito do Triangulo, a poucos quilômetro do bairro Paciência, não havia iluminação residencial e tudo era feito á luz da lamparina.
Aproveitando a escassa iluminação, resolvi guardar o bife de fígado no bolso do paletó, e com isso, na primeira esquina, jogar fora.
Coloquei os dos grandes pedaços no meu bolso, recusei quando me ofereceram mais, tomei bastante Crush (refrigerante de laranja da época) e Grapette e sai da mesa.
Minha intenção era me livrar daquele incômodo passageiro do terno.
Acontece que o cachorro já estava sentindo o cheiro forte do bife no meu bolso, e me rodeava, eu o expulsava e ele voltava.  
Seu ferreira resolveu tocar a bendita valsa da meia noite e pediu que eu e sua filha dançássemos.
Estava nervoso, o Leão me cheirando a Geni e seus pais desconfiados de algo, mas  não sabiam o quê.
De repente o canzarrão avançou para cima de mim e numa dentada espetacular, arrancou parte do meu terno, me jogando e me arrastando pelo chão da sala, até conseguir pegar o pedaço o pedaço da carne que eu havia escondido.
Minha cara foi La embaixo de vergonha; de um lado várias pessoas estupefata; do outro, um cão feliz a devorar um sanduíche de linho com fígado de boi e mais adiante, um infeliz cidadão à cata de uma explicação plausível... e ela saiu:
- O que está acontecendo rapaz? Por que guardava no seu bolso a carne?
Ao que respondi: - Olha meu sogro, o fígado estava tão bom que resolvi levar um pedaço para minha querida mãezinha, e fiquei sem jeito de lhe pedir.

- Ora rapaz! Exclamou meu dileto sogro- Você é de casa! Maria prepara uns bifes para o rapaz levar para a mãe dele, e venha cá vamos comer um picadinho de fígado que sobrou...
- Socorro!!!!!!!!!!!!!!

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